Saturday

Se eu fosse honesto comigo próprio, talvez pudesse aceitar que este exercício, esta tentativa de debitar sobre a página, é uma manobra de sobrevivência, um golpe de asa perante um desespero disfarçado.

Existe um jogo difícil que fazemos todos os dias com a realidade. Queremos ver as coisas como elas são e quando sabemos que as limitações dos sentidos nos impedem de chegar a uma autêntica verdade, fazemos as correcções que julgamos necessárias para contornar as deficiências da observação. Toda a ciência é um jogo de gato e rato com a verdade. Por vezes é necessário armadilhar os caminhos para que os fenómenos se mostrem. Os caminhos não são lineares porque se o fossem teriam sido descobertos há muito. Mesmo as coisas que depois de conhecidas parece que sempre estiveram ali e não fomos capazes de vê-las, estiveram de facto tapadas por um impenetrável preconceito que impedia a visão do óbvio.

O óbvio é uma palavra perigosa. Geralmente usa-se para agredir, como muitas outras da mesma família.

O jogo que no dia-a-dia fazemos com a realidade não tem à sua disposição os poderosos recursos da ciência, e os truques para alcançar o conhecimento não são reprodutíveis quando o objecto de estudo é um ser não abstracto, único, dinâmico e irrepetível. Isso seria suficiente para que não se desse o erróneo nome de ciência aos estudos que não podem usar a metodologia científica. Mas, na falta de conseguir chegar à verdade, apetece chegar à aparência de verdade.

E isso acontece mesmo na relação entre duas pessoas.

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